Este é o tempo em que o assunto dos impostos está na ordem do dia. Tal como hoje, também no passado existiam os impostos cobrados ao nível central pelo Estado, e ao nível periférico pelas instituições políticas municipais, caso dos mercados ou feiras. No que respeita aos impostos cobrados pela coroa, eles eram arrecadados por um indivíduo nomeado para esse efeito: tratava-se do recebedor do concelho. Em 12 de Novembro de 1836, Tomás Maria de Paiva Barreto, contador da fazenda do distrito de Viseu, nomeou como contador do concelho de Moimenta da Beira Custódio Coutinho da Costa Teixeira por “nelle se acharem os requezitos necessários”. No auto de nomeação da Contadoria Distrital acrescentava-se ainda que o contador de Moimenta da Beira deveria servir nesse ofício “emquanto bem o dezempenhar e assim convinha ao serviço Nacional, devendo aprezentar dentro em trinta dias a sua escriptura de obrigação e responçabilidade que toma sobre si e sem o que não terá efeito esta nomiação a qual deve ser registada na respectiva Camara”.
Além dos impostos cobrados pelo Estado, cabia às Câmaras regulamentar os mercados locais e fixar as contribuições indirectas. Os mercados ou mais especificamente as feiras eram sobremaneira importantes para as sociedades do passado. Talvez por isso, cedo houve a consciência de que deveriam ser regrados e tributados. É preciso recuar aos tempos medievos para encontrar a génese do planeamento logístico e económico de que passaram a ser objecto os mercados e as feiras. O preço dos produtos, para que existisse equidade era também uma preocupação das autoridades. A título de exemplo, alguns forais aludiam a esse aspecto. Apenas as feiras francas, criadas e impulsionadas pelo “lavrador” (rei D. Dinis), não eram tributadas. Estas, além de pressuporem uma graça ou um privilégio do rei para com determinadas localidade, destinava-se especificamente a impulsionar o comércio, reabilitando o povoamento de zonas ermas. Exceptuando as feiras francas, de que foi exemplo a célebre feira franca de Viseu (que ainda hoje se realiza em memória da feira antiga), ou a feira franca de S. Tiago de Leomil, de gado lanígero, que se realizava no dia do padroeiro da vila, todas as outras estavam sujeitas a impostos.
Eram muitas as feiras que se realizavam no actual concelho de Moimenta da Beira. Umas de carácter mais esporádico, ou sazonal, outras de frequência mais basta, eram bem mais do que aquelas que se realizam na actualidade. Moimenta tinha regularmente feira, a qual se realizava nos terceiros domingos e primeiras segundas-feiras de cada mês. Os mercados da vila de Moimenta da Beira remontam ao período moderno e sempre houve a preocupação de os regulamentar. De tempos a tempos, e porque a evolução económica ia sofrendo alterações, as Câmaras Municipais discutiam e fixavam o valor das contribuições a cobrar. Foi o que aconteceu em Moimenta da Beira no ano de 1836.
Governava os destinos da autarquia António Rebelo de Andrade, o qual tinha como vereador fiscal José da Rocha Pinto, como terceiro vereador Manuel Loureiro Sobral, como quarto vereador António Joaquim de Almeida e como quinto vereador José Gomes de Carvalho. António de Lemos se chamava o secretário da Câmara, a quem se incumbia o ofício de lavrar por escrito o conteúdo de todas as sessões.
Em 13 de Junho a Câmara lançou a contribuição indirecta aos mercados da vila, ou seja, o valor que deveriam pagar os comerciantes para exercerem a sua actividade. Este rol era condicente com o género de actividades comerciais existentes pelo que nos indica o tipo de comércio existente. Acresce para mais que os valores diferenciados por cada tipo de actividade tinham em consideração, estou em crer, o volume de negócios, pagando mais os ofícios mais rentáveis.
Os negociantes de panos pagavam 100 réis; os contrabandistas pagavam 100 réis; os tendeiros galegos pagavam por cada carga ou costal 100 réis; os tendeiros portugueses por cada carga pagavam 100 réis; os vendedores de linho em rama pagavam 20 réis; as tecedeiras pagavam 20 réis; os vendedores de queijos e galinhas pagavam 10 réis; os ferreiros pagavam 40 réis; os vendedores de pregagem pagavam 40 réis; os coureiros (vendedores de couro) pagavam 100 réis; os vendedores de socos ou sapatos pagavam 40 réis; os vendedores de “cousa branca ou negra” pagavam 40 réis; os vendedores de frutos ou hortaliças pagavam 20 réis; os vendedores de chapéus pagavam 40 réis; as padeiras de fora do concelho pagariam 20 réis; os comerciantes de bebidas ao quartilho pagariam 20 réis; as “frutadeiras” (vendedoras de fruta) de fora do concelho pagariam 10 réis; os negociantes de carne de porco seriam tributados em 20 réis; às peixeiras seriam cobrados 40 réis por cada carga; por cada carga de arroz ou bacalhau ou açúcar cobrava a Câmara 40 réis; cada carga de peixe grande era tributado a 40 réis; os vendedores de doçuras pagavam 20 réis; pelo negócio de cestaria eram cobrados 20 réis; os negociantes de tabuleiros, maceiras e gamelas pagavam 20 réis; o negócio de meias e carpins exercia-se com o pagamento de 10 réis e finalmente a retrosaria e negócios de seda pagavam 40 réis.
No ano seguinte, a 30 de Abril, era já presidente o carismático e bairrista João Vieira de Azevedo (cuja assinatura apresento na imagem), a Câmara haveria de se pronunciar novamente em relação à matéria das contribuições directas, indirectas ou mistas sobre as quais versavas o Código Administrativo Português. Neste contexto acordou o executivo camarário lançar a cada quartilho de vinho vendido nas tavernas das freguesias do concelho, o imposto de 1 real; por cada almude, 44 reais; por cada pipa, 968 réis. Estes impostos incidiam sobre “quem tiver loja aberta a ramo à porta e os mais proprietários poderão vender almudado livremente sem pagar direitos tanto na villa como no concelho”. Além desta resolução, o edil moimentense deliberou também que se aplicasse o imposto de 120 réis para cada almude de vinho que entrasse no concelho. A ideia era proteger e impulsionar os vitivinicultores locais pois fazia-se questão de vincar que aqueles que fossem naturais do concelho e produzissem dentro dos seus limites ou fora deles nada pagariam pela produção. O mesmo não acontecia os produtores de fora do concelho que produzissem em Moimenta.
Ainda no mesmo mês os membros da Câmara fiscalizaram os grémios da praça e mercados da vila e lavraram uma certidão onde constava que o alqueire de trigo se vendia a 620 réis; o alqueire de centeio era comercializado a 440 réis; o alqueire de milhão era vendido ao preço de 370 réis e o alqueire de feijão branco riscado vendia-se a 500 réis. Dois meses depois, a 17 de Junho, nova fiscalização. O alqueire de trigo descera para os 550 réis; o preço do alqueire de centeio manteve-se; o alqueire de milhão desceu para os 310 reis; o alqueire de cevada que não constava da fiscalização anterior era mercadejado a 160 réis e o alqueire de feijão vendia-se a menos 100 réis do que dois meses antes.
Além de tudo o já mencionado, importa referir ainda que havia alguns ofícios que tinham determinados privilégios de isenção. Era o caso do ofício de estanqueiro. Prova disso, em 16 de Janeiro de 1838 Joaquim José da Costa Araújo, pai do futuro conde da Lobata, apresentou à Câmara a sua carta de privilégios na qualidade de estanqueiro.
Importa sublinhar, a terminar, que esta matéria, e os ecos que dela ficaram, presta-se a compreender melhor o passado e também o presente, como seu subsidiário. Todo o passado deixa marcas e as sociedades do presente têm profundas ligações às sociedades do passado. Acresce para mais que as profissões mencionadas se prestam aos Ranchos Folclóricos do nosso concelho que quiserem ser fidedignos recuperadores da memória, da História, da etnografia e do folclore relativos ao século XIX.
Publicado na última edição do Jornal Terras do Demo
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