segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Praça Pública - Semanal

Há lodo no caís «Miguel Sousa Tavares»

1 Mais tarde ou mais cedo, um BPN iria rebentar-nos nas mãos. Acabou por rebentar tarde de mais e sem nada que ver com a crise financeira mundial. O BPN não ficou falido, com 700 milhões a descoberto, devido a dificuldades da conjuntura ou até a erros de gestão. Não, o BPN faliu devido às vigarices em que se envolveu e que estavam na raiz da sua própria criação: por alguma razão o baptizaram de Banco Português de Negócios. Negócios de lavagem de dinheiro, de "off-shores", de financiamento da corrupção, enfim, de todo o cardápio de malfeitorias possíveis neste ramo de negócio.
O BPN não foi criado nem por banqueiros nem por gente com algum conhecimento ou experiência no ramo. Foi criado por gente que vive e prospera nessa zona cinzenta onde confluem a política e os negócios: um pouco de bloco central, com os 'socialistas' dos negócios e muito do supostamente defunto núcleo do cavaquismo dos anos 90. À frente do BPN, nos tempos do fartar-vilanagem, esteve o dr. Oliveira e Costa, sibilina figura do 'cavaquismo de província', que então foi secretário de Estado do Fisco e no BPN se dedicou a abrir cerca de oitenta contas em "off-shores", onde se esconde dinheiro e não se paga impostos. Por aqui se pode ver desde logo o estofo moral de alguns que às vezes nos calham em sorte na governação. É sem dúvida revoltante e paradigmático que o dinheiro dos impostos que tanto custam a pagar a tanta gente sirva agora para evitar a falência de um banco que as tropelias de um ex-responsável pelo Fisco levaram à falência. É sempre assim: quando tudo o mais falha - a cautela, a vigilância de quem deve, a simples decência e vergonha - resta o dinheiro dos contribuintes para apagar o incêndio.
Quando, há quase um ano, saltou para a praça pública a peixeirada interna do BPN, isso não surpreendeu rigorosamente ninguém, pois que, à boca cheia, já tudo e todos comentavam o que lá se passava e a impunidade de que parecia gozar o banco. Compreendo que o Estado tenha optado agora pela nacionalização como forma de defender o dinheiro dos depositantes, mas, 280.000 ou não, duvido que eles não achassem estranho que o BPN remunerasse mais o seu dinheiro que qualquer outro e que não desconfiassem de nada, nem que fosse apenas olhando para os nomes e caras daquela gente. De então para cá, tiveram tempo e informações suficientes para poderem sair e ir para paisagens mais arejadas. Mas não o fizeram, talvez porque, como ouvi agora a alguns deles, tinham a garantia de que o Estado (isto é, os contribuintes) acorreria, como acorreu, em caso de necessidade. Aliás, soube-se há menos de um mês (já depois de ter sido chamada a polícia), que o Estado, através da Caixa Geral de Depósitos, tinha emprestado 200 milhões ao BPN e soube-se agora que lá mantém uma conta-corrente, cujo montante não nos é dado conhecer. Não sabemos assim até que medida a nacionalização não visa também proteger a falta de juízo do próprio Estado.
Tenho sinceras dúvidas de que a opção de deixar o BPN ir à falência, declará-la fraudulenta com as respectivas consequências criminais e garantir aos depositantes aquilo que recentemente foi garantido para todos, não fosse a melhor decisão para os contribuintes e a mais saudável para a vida económica. Servia pelo menos como aviso para futuros candidatos à generosidade pública.

2 O dr. Miguel Cadilhe é o mais improvável herói desta suja história. Seguramente que sabia ao que ia e imaginava bem o que iria encontrar, quando aceitou, em Junho, a presidência do BPN. E tanto o sabia que tratou de negociar, como condição de aceitação, um sumptuoso plano de reforma, para o caso de as circunstâncias o virem a obrigar a ir-se embora antes de tempo. Mas o que viu, quando lá chegou, acabou também por forçá-lo, à cautela, a chamar a polícia, não fossem depois acusá-lo de ter omitido a gravidade da situação. Ao mesmo tempo, propôs à tutela que lhe emprestasse os 700 milhões de euros que estavam a descoberto, sem nenhumas garantias efectivas de poder pagar e apenas para garantir que o negócio continuaria, como de costume. Se bem percebi as suas intenções, a polícia trataria do passado do BPN, os contribuintes tratariam do presente e ele manteria o seu lugar para o futuro. Teixeira dos Santos recusou e fez bem. Cadilhe vingou-se, descarregando a sua ira no supervisor, o majestático dr. Constâncio - que, verdade se diga, está adormecido há séculos.
Mas são coisas diversas, a falta de regulação e a falta de escrúpulos. A única coisa comum é a saturação deste bloco central dos negócios e dos cargos públicos. Em troca de tantas benesses, cargos e atenções do poder que sempre tem recebido esta gente, o que lhes deve, afinal, o país?

3 O movimento de cidadãos de Lisboa contra a ampliação do Terminal de contentores de Alcântara, de que sou um dos fundadores, anunciou no passado dia 27, em conferência de imprensa, que iria abrir uma subscrição pública contra o decreto-lei que autorizou a celebração de um contrato entre a Administração do Porto de Lisboa (APL) e a concessionária Liscont. O objectivo da petição (que atingiu o mínimo de 4000 assinaturas necessárias em 24 horas), foi entregar na Assembleia da República um pedido de ratificação parlamentar do decreto do Governo. O pedido está entregue e isso significa que os deputados vão ter de apreciar o diploma do Governo e poderão revogá-lo, se assim o ditar a sua consciência e a sua noção de interesse público. Sabedora disto, a APL tratou de, logo no dia seguinte, assinar a correr o dito contrato com a Liscont, mediante o qual esta ficou desde logo garantida com uma brutal indemnização no caso de o projecto não ir adiante. Tudo devidamente cozinhado entre dois conhecidos escritórios de advocacia de negócios, muito socialistas.
Há quem considere isto uma falta de respeito inadmissível pela Assembleia da República, por parte de um organismo público, que administra coisa pública e cuja tutela cabe ao Governo. Há quem considere também uma estranha noção do que é a vida democrática e a consideração devida pela opinião pública. Eu não considero nada disso. Considero um escândalo, puro e simples. Um gesto que diz tudo sobre a dimensão dos interesses que estão em jogo e a influência que alguns muito poderosos têm sobre os actos da governação pública. É o Estado cativo de interesses privados. Terceiro-mundo.

4 A propósito do negócio de Alcântara, o campeão nacional da asneira - o ministro das Obras Públicas, Mário Lino - resolveu meter-se ao barulho e declarar que um quilómetro e meio de extensão de contentores empilhados à beira-rio "terá um impacto visual mínimo". Quem possa ter dúvidas, que vá lá ver e imagine o que ali está multiplicado por três. Entre outras coisas, constatará que, ao contrário do que jura a Liscont, não é verdade que "razões técnicas" impeçam amontoar cinco contentores em cima uns dos outros: anteontem, havia lá várias pilhas de seis. Talvez Mário Lino não consiga, sinceramente, distinguir a diferença entre uma paisagem de contentores com 15 metros de altura e a de um rio ou a do 'Queen Mary II' acostado à Gare Marítima. Mas a Cunha Vaz e Associados e a LPM - os arguidos habituais na 'assessoria de imagem' dos grandes negócios - bem podiam justificar o dinheiro que cobram à Liscont e à APL mandando o ministro ficar calado. É que, de cada vez que ele leva a arma à cara, seja para defender a OTA, o TGV ou o Terminal de Alcântara, o tiro sai pela coronha. (Fonte: Jornal Expresso, Segunda-Feira, 10 Novembro)


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12 comentários:

Anónimo disse...

Boas!
Ontem assisti com atenção o programa Prós e Contras da RTP, onde foi debatido esta vergonhosa teia de interesses!Sem dúvida que o Escritor e Jornalista Miguel Sousa Tavares tem toda a razão em estar à frente desta petição!Os contribuintes mais uma vez é que pagam a factura e andam estes "chicos espertos", a viver bem à conta do Estado!O mais incrível é nem a Secretária de Estado das Obras Públicas conseguiu desmontar o esquema que por ali anda par os lados do rio tejo!Gente suja, oportunista e sem escrúpulos!

Anónimo disse...

partilho da mesma opinião. este país está cada vez pior.

Unknown disse...

Miguel Sousa Tavares proferiu ontem no programa Prós e Contras da RT1 uma frase verdadeiramente demonstrativa daquilo que foi, é e será a actuação dos vários agentes na sua forma de estar na sociedade, “o mercado funciona e o Estado paga”.

Anónimo disse...

Sou completamente da tua opinião!TODOS OS CONTRIBUINTES é que pagam!
Alguma população nem tem noção dos milhares de euros que estão em jogo!Que infelicidade a nossa...

Anónimo disse...

Eu já ficava contente se acabassem "doações" monetárias para os milhares de associaçoezinhas que nunca apresentam contas a ninguém. Era uma maneira de acabarem e só resistirem as que merecem. Tenho a certeza que, a longo prazo, isso ia ter consequências na mudança de mentalidade (afinal elas são feitas por nós!). E o nosso problema é a mentalidade - temos no Sr. "engenheiro" Pinto de Sousa o melhor exemplo!

Sérgio Matos Dias

RMLR disse...

Amigos bloggers,
Eu pessoalmente tenho uma opinião contrária, sendo que em alguns pontos estou de acordo com o que se vem dizendo sobre o assunto.
Vamos por partes. O problema do porto de Lisboa, já existia e vai ter de continuar a existir. O que se pretende é melhorar as condições de operacionalidade do porto e criar uma maior margem de capacidade de armazenamento, e fazer frente aos projectos que se avizinham, e se quer, para colocar e manter o porto de Lisboa no mapa dos grandes cargueiros mundiais. Mas isso não é só e apenas o motivo de este projecto.
Como exemplo comparativo, podemos por em causa o novo Aeroporto de Lisboa e o TGV, pelos investimentos previstos e quais a contrapartidas e proveitos destes projectos.
Mas como já é comum no nosso País, andamos sempre 10 a 20 anos atrasados em relação ao resto da Europa desenvolvida. e este projectos fazem-nos andar a par dos poderosos da Europa e de alguns do resto do Mundo.
Voltando ao caso do porto de Lisboa, grande parte do investimento é privado, e do valor aplicado dos contribuintes, será em acessibilidades e reordenamento de Alcantara.
Se me perguntarem se a entidade privada vai ganhar muito dinheiro com isto, acredito que sim, mas é para isso que lá estão e o risco é esse mesmo, pode ou não ser rentável.
A continuação do porto de carga naquela zona, não é estéticamente bonito, mas é uma necessidade de ter uma estrutura destas em Lisboa, e de preferencia a norte do Tejo, até porque a maior utilização está mesmo a norte.
Vai continuar e manter a rentanbilidade das empresas que importam e exportam via este porto.
A manutenção de muitas empresas que gravitam em torno deste negocio.
Além de que, seria complicado não termos um porto de entrada de muitos bens de consumo que nos chegam diariamente sem dar-mos por isso. Imaginem que deixavam de existir supermercados em POrtugal, e teriamos de fazer compras a Espanha, ou para podermos ter cá esses produtos, termos de pagar mais 20 ou 30 %. Seria mesmo muito complicado, na minha opinião.

Nota: esta é a minha opinião, que apenas é expressa aqui para algumas pessoas, o que me faz confusão é o facto de alguns ditos notáveis do nosso País, sem terem conhecimentos de causa e técnicos, darem opiniões em suposições e por contas feitas de cabeça, indusindo e influenciando os menos conhecedores das situações.

Eu falo disto porque estive presente num debate sobre estes assuntos, no ambito do grandes projectos para o nosso País.

Como curiosidade: os valores que se estão a falar, não se aproximam dos que se gastaram nos estádios do Euros, e esses não tem nem metade da rentabilidade destes projectos.

Cumprimentos,

Rui Requeijo

Unknown disse...

Uma reflexão sobre a maioria dos contratos de concessão (scut´s a titulo de exemplo).Que principio de livre concorrência está subjacente neste tipo de contratos quando o prazo é uma eternidade? Cito o Presidente do Tribunal de Contas.
Passo a explicar, embora o exemplo citado seja extremado.Alguém inventa uma vacina contra a sida.São investidas quantias astronómicas neste projecto.Celebra-se um contrato de concessão com o Estado por 50 anos.Pergunto qual é o meu risco sabendo que o retorno será muito maior.
Os contratos de concessão ferem um dos princípios basilares da democracia:"o Sol quando nasce é para todos".

João PM Dias disse...

Concordo em parte com o que foi dito até ao momento.

Tudo o que seja investimento em "obra fisica" eu estou de acordo, desde que seja para acompanharmos o crescimento da restante comunidade europeia!

Tenho é pena que Moimenta da Beira nunca faça parte desses ditos grandes investimentos públicos.

Onde está o IC 26?

abraço,
joaomd

PS: Obrigado a quem assina!

Anónimo disse...

Dias Loureiro tinha dúvidas e continuou ligado à SLN/BPN.. e até foi a Porto Rico ver e comprar fábricas que não existiam e aceitou assinar um relatório de contas em que não constavam esses negocios e agora tenta convencer os incautos "foi pedir ao BP para fiscalizar o BPN ... Cavaco teve no seu governo o actualmente detido presidente do BPN, conhecido pelas amnistias dadas no distrito de Aveiro e na altura também não disse nada..

Anónimo disse...

O mal-estar está instalado nos corredores do poder. Os políticos honestos, poucos, mas ainda existem, têm pressa que todos os suspeitos sejam arrecadados de modo a existir paz. Adivinho que durante a próxima semana mais alguns visitem os calabouços da PJ. Se o polvo não for agarrado, só as forças armadas, que o insigne PM pretende extinguir, é que safam o país. As polícias de nada servem nestes casos, porque depressa se transformam em milícias.
Vai ser a hora dos juízes.

Anónimo disse...

Paninhos quentes como no escândalo da Casa Pia!O PR coitadinho nem conhece os ministros que tem!Agora, nesta altura do campeonato faz declarações!MEDO, INSEGURANçA; CULPA!é o que é!
Por favor governantes PÁREM DE PENSAR QUE O ZÉ POVINHO É TODO COMPLETAMENTE ATRASADO MENTAL!!!
Como diz o povo "Não há mal que sempre dure, nem bem que nunca acabe!". ISTO É O PRINCIPIO DO FIM, da corrupçao admitida, da miséria admitida, dos antídotos que nos querem impigir com árvores de Natal gigantes em que os contribuintes arruinados têm que pagar a factura da electricidade a rir...PAREM DE NOS ATIRAR AREIA PARA OS OLHOS. A casa Pia e o escandalo do BPN só vieram por a NU a faceta de demónio dos nosssos governantes: corruptos e pedófilos!O que é que querem mais?Pior do que isto?Não Há!E VIVA A VERGONHA DE PORTUGAL!

Unknown disse...

Alguém me pode elucidar quem é o Sérgio Matos Dias. Obrigado