segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Praça Pública - Semanal

Dívidas, Vara e o poderoso Estado «Áurea Sampaio»

Funcionários públicos, professores, médicos, magistrados, militares... são zurzidos, responsabilizados, processados, avaliados, fiscalizados, mas os gestores passam incólumes.

Há vinte empresas do sector público empresarial cuja dívida, em Dezembro de 2007, ultrapassou 17 mil milhões de euros. Não, não é engano. Este número astronómico foi revelado por uma auditoria do Tribunal de Contas e dá bem a medida da qualidade dos nossos gestores públicos. Uns por manifesta inépcia, outros porque se vergam, sem critério, às instruções emanadas dos ministérios, esta casta de altos funcionários, muitos deles sem qualquer tipo de qualificação para o cargo senão a cor do cartão partidário, continua alegremente a desbaratar os recursos do País sem consciência ou pingo de remorsos. O mais extraordinário é que estes resultados miseráveis são de empresas que actuam sem concorrência, ou, tendo concorrência, como a RTP, beneficiam de generosas ajudas do Estado, distorcendo o mercado e criando dificuldades acrescidas àqueles que só vivem das receitas próprias. Aliás, a RTP, com um défice superior a 940 milhões de euros, consegue a proeza de integrar o lote das seis empresas mais devedoras as quais, por si só, acumulam 84% do total da dívida.
O Governo os governos vai permitindo esta impunidade e dribla os números com a habilidade de quem faz exercícios de prestidigitação. Não contabiliza estes dados nas famosas «contas públicas em dia», uma aldrabice tantas vezes martelada que já se transformou em verdade absoluta, e desorçamenta, com a alegria pueril de quem não quer pensar em problemas.
Enquanto isso, os boys engordam e continuam impunes. Ninguém lhes toca.
Por este ou outros Executivos, nunca lhes foram impostos limites ou pedidas contas.
Funcionários públicos, professores, médicos, magistrados, militares... são zurzidos, responsabilizados, processados, avaliados, fiscalizados, mas os gestores passam incólumes. Ainda agora, o novo episódio do «caso» Armando Vara é paradigmático.
Saiu da Caixa Geral de Depósitos (depois de ter entrado, como director, no meio de grande polémica, já durante o Governo Sócrates), em Janeiro de 2008, para ocupar um cargo na administração do BCP. Não é que, um mês depois de ter saído, a direcção do banco público resolveu promovê-lo ao escalão máximo do vencimento, na instituição? Questionada a medida que irá beneficiar, a prazo, a reforma de Vara, a administração da CGD diz que a promoção está em linha com a regra da casa e que outros usufruíram dela. Mas recusa-se a dizer quem e a discutir a bondade da decisão. Trata-se de uma sobranceria sem limites, que ilustra bem o comportamento do Estado.
É importante que, quando a crise está a «justificar» a intervenção cada vez maior do Estado na economia, se reflicta muito bem nas consequências que tal pode acarretar. Infelizmente, Portugal não é um daqueles países do Norte da Europa em que uma ministra se demite por ter usado o cartão de crédito público para comprar um chocolate ao filho. Pelo contrário, é um país em que o Estado é tradicionalmente opaco, protector dos venerandos e obrigados, compreensivo e de mãos largas para os amigos e que, não raro, confunde interesse público com interesse partidário. Num país altamente deficitário em gente capaz de correr riscos, deve ser-se parcimonioso nos aplausos à intervenção estatal. Até porque é fácil a entrada deste nas empresas. O pior, depois, é sair. (Fonte:Visão)

13 comentários:

Alex disse...

Concordo com algumas partes deste texto...obviamente concordo (só os gestores de bolsos cheios devem discordar) do papel que essa elite tem tido. Nada lhes é cobrado, tem mais vidas que o gato e a impunidade é o seu cartao de visita.SE um de nós nao pagar a renda de casa estamos feitos ao bife, mas os 80 milhoes(ou mais, nunca saberemos bem) do bcp esses foram roubados impunemente.No entanto denota-se uma mensagem implicita neste texto contra o investimento público, que no fundo é a converseta que os neo-liberais nos tem habituado...demonizar o estado e santificar o investimento privado. A questao é que dos gestores privados não vi ainda melhor prestação nem consequencias positivas para o país (bem pelo contrário).É preciso é acabar com o estado corrupto, clientelista, não acabar com o estado como dizem burgueses de bolso cheio e suas receitas de sucesso, como o "compre-me isso portugal" -http://www.compromissoportugal.pt/

Moimentense de Gema disse...

Boas

Excelente texto, concordo totalmente...

O Estado em Portugal é excessivamente grande, como diz a própria OCDE. As empresas públicas dão grandes prejuízos. Em Portugal estamos habituados a que o Estado intervenha em todos os sectores, talvez aí esteja a razão da nossa situação. É uma questão de mentalidade. Os países mais avançados do mundo têm um menor peso do Estado nas suas economias...

Concordo que há sectores que têm que ser assegurados pelo domínio público (educação, segurança, justiça, saúde e redistribuição), mas a sua intervenção deve ser reduzida noutros sectores, pois o sector privado é sem dúvida mais eficiente do que o sector público. Vejamos como exemplo as obras públicas: Casa da Música, Ponte Vasco da Gama, etc...

Vejamos o caso da China, só se desenvolveu com a abertura à iniciativa privada, que originou concorrência de preços, e é hoje o grande motor da economia global.

A economia centralizada implodiu no seu grande berço, vejamos o atraso económico de Cuba e da Coreia do Norte. Não é esse o caminho a seguir na minha opinião

Neste momento, Portugal vai seguir a doutrina Keynesiana de aumentar o investimento público em fase recessiva, mas depois não vai seguir, como não seguiu noutros momentos, a contra-parte que é o acumular de capital em fase de expansão para poder gastar em fases negativas do ciclo económico. O Estado vai entrar fortemente na economia, veremos quando vai sair dela.

O capitalismo não é um modelo perfeito, deve ser regulado, deve ter penalizações para quem toma as más decisões e tem as suas limitações, mas é para mim sem dúvida "o menos mau de todos os sistemas".

Cumprimentos
João Pedro

Unknown disse...

Quem viu o pros e contras?
Aqueles é que sao os gestores.

João PM Dias disse...

Boas,

Como já tenho dito e como refere o amigo JP, é uma questão de MENTALIDADE.

abraço,
joaomd

José Carlos Gomes disse...

Grande Alex! Não fales na edilidade moimentense que existe muita gente que fica melindrada.

João PM Dias disse...

É verdade. Concordo.

"É preciso é acabar com o estado corrupto, clientelista, (...)"

Aplica-se ao nosso meio!


abraço,
joaomd

Sérgio M. Dias disse...

Depois de ler este post penso imediatemente de que consequências teria o seu autor num país onde a decência imperasse. É que, realmente, num desses países este tipo de afirmações trariam consequências muito desegradáveis para o seu autor. Não quero com isto apontar qualquer dedo ao quem escreve e faz estas críticas. Acho muito bem que se denuncie o que está mal. Quero apenas transmitir a ideia de que chegámos a uma altura em que podemos fazer as acusações mais graves e insinuar mil e uma coisas que nada muda. Ninguém fica chocado ao ouvir estas coisas.
É com muita pena que cada vez mais sinto que chegámos a uma situação onde podemos fazer tudo. Bem ou mal. Não há consequências a sofrer.
Gostava de ouvir e ler destes textos muito raramente e, quando isso acontecesse, ficar chocado. Mas agora já nada nos choca. É tudo tão normal e natural.
E este estado (e Estado) decrépito vai continuar.
Ideologicamente, não comungo das teorias marxistas-leninistas, nem acho que sejam exequíveis. Na minha opinião, a economia de mercado, com todos os grandes defeitos que tem (estamos agora a vivê-los em todo o seu esplendor), é, de longe, a melhor maneira de o mundo girar. Mesmo com estes graves problemas que, ciclicamente, aparecem. Agora, é claro que o bom senso deve abençoar todos os que intervêm nos seus processos. E, por que não o Estado se preocupar simplesmente em regular, fiscalizar, "whatever" (!), em vez de estar preocupado em fazer isso e em ser mais um "player" nos mercados?!

Cumprimentos (em especial para o Sr. Gomes),

Sérgio Matos Dias

P.S. Quem quiser ser respeitado e ter uma opinião respeitada deve fazer por isso. A credibilidade constrói-se aos poucos.
Eu acredito que o Sr. Gomes consegue fazer melhor, mas para isso não pode dizer simplesmente tudo o que lhe vem à cabeça. É que já ninguém se sente insultado quando o Sr. diz alguma coisa!

José Carlos Gomes disse...

"É que já ninguém se sente insultado quando o Sr. diz alguma coisa!"

Obrigado e gostaria de retribuir os seus cumprimentos.

Deveria alguém estar insultado? Ou porventura estarei a interpretar mal as suas palavras, Sérgio Matos Dias?

José Carlos Gomes disse...

Faltou a associação de ideias.Fui lento!!!Agora já sei quem é, Sérgio Matos Dias.
Credibilidade?
RISOS E MAIS RISOS E MAIS RISOS

Unknown disse...

A crise assenta em Destruição. Colapso. Depressão. Pânico. As palavras parecem aplicar-se igualmente à crise financeira mundial e aos seus efeitos sobre a psique humana. É claro que é cedo para avaliar as verdadeiras conseqüências psiquiátricas da crise económica; demorará algum tempo para se ter a certeza se houve ascensão nos índices de depressão ou suicídio. Resta a questão de que a crise está a deixar as suas marcas nos indivíduos, especialmente os homens.

Unknown disse...

bem, moimentense de gema, permite-me descordar, ams o exemplo da China não pode ser apontado como exemplo de sucesso.O facto de ser uma potencia economica deve-se tao somente ao facto de manter uma estrutura bolchevique de controle tipicamente maoista, com um mercado selvagem assegurado pela cupula do pc chines.Por outras palavras, tem o pior dos 2 sistemas: o controlismo ditatorial dos regimes bolcheviques e o liberalismo selvagem. O que ás vezes os economistas se esquecem(e isto naoe uma critica só a ti, mas á tua area) é que desenvolvimento e qualidade de vida nao são aspectos meramente economicos, mas sim conceitos efectivos como felicidade e liberdade. A China é um estado opressor (veja-se o Tibete) e ditatorial, não há indice economico que apagiue isto.

Alex disse...

SO PA DIZER QUE O MIDNIGHT SOU EU, CONTAS DIFERENTES DEPOIS BARALHO TUDO...SOU UM CROMO NA INFORMATICA AHAH

Moimentense de Gema disse...

Boas...

Alex, é verdade o que dizes sobre os economistas, mas desta vez eu estava a falar apenas de um sucesso na vertente económica e não na vertente social...
O regime ditatorial Chinês que ficou bem patente no caso da opressão ao Tibete demonstra bem que aquele regime político não é exemplo a seguir...
A China teve e está a ter sucesso em termos económicos com a sua abertura ao exterior, mas claro que lhe falta a abertura em termos políticos para progredir na sua vertente social, e como tu dizes, aumentar o seu bem-estar.
Sou contra regimes ditatoriais...

Abraço