terça-feira, 21 de junho de 2011

«Arqueologia» - Sobre a morte


Túmulo[1] do Desembargador Rodrigo Sarmento de Vasconcelos e Castro[2]
Localização: adro, lado direito da Igreja Matriz de Paradinha
Em sete linhas ficou gravado, na tampa sepulcral, o seguinte:

AQUI JAZ.
ODEZ.RODRIGO
SARMENTODEUAS.COS
ECASTRO
FALESCIDO
NO DIA 23 DE MARCO
E1837

Ou seja: «Aqui jaz o Desembargador Rodrigo Sarmento de Vasconcelos e Castro, falecido no dia 23 de Março em 1837».
De salientar que a inscrição termina com um elemento decorativo.
           
Três palavras etiquetam a morte: a primeira é a sua irrepetibilidade; a segunda é a incomunicabilidade; a terceira, a certeza. Ou seja, a morte é a certeza humana de uma experiência única, incomunicável e inevitável. Porque nenhum ser vivo morre mais do que uma vez ou consegue ir ao lado de lá da vida para contar aos outros a sensação, ou mesmo arvorar-se em imortal.
Daí que, apesar das ditas revelações, permaneça sempre a dúvida à volta deste tenebroso mistério.
Por isso, criam-se rituais (os velórios, as procissões), veneram-se divindades e constroem-se túmulos verdadeiramente espantosos, como é o caso das famosas três Pirâmides do Planalto de Gizé, no Egipto – as únicas remanescentes das Sete Maravilhas do Mundo Antigo – mandadas erguer pelos faraós Quéops[3], Quéfren e Miquerinos, entre 2 600 a. C. e 2 500 a. C., como mausoléus para os seus corpos.
Gestos que a contenham (a morte), que a tornem menos chocante, que lhe dêem um ar de ilusão e, ao mesmo tempo, recordem e perpetuem, da melhor maneira, o defunto.
E parece ter sido sempre assim, desde que o Homem tomou consciência da sua existência, de que um dia havia de morrer.
Na Pré-História, construindo túmulos[4] com enormes pedras, bem identificáveis na paisagem.
No tempo dos Romanos. Na Idade Média. Nos nossos dias. Em todas as religiões.
É impressionante verificar como mitos e rituais ligados ao mundo dos mortos, imbuídos de enorme simbolismo/secretismo, se repetem, ao longo de muitos séculos, nas diferentes formas de enterramento (antas, cistas, sepulturas escavadas na rocha, sarcófagos, estelas discóides), isoladamente ou em grupo, quer no exterior quer no interior dos edifícios religiosos; com ou sem espólio associado (objectos pessoais); anónimas, sem quaisquer informações acerca dos defuntos; decoradas com cruzes, estrelas, coroas e rosáceas ou personalizadas através de inscrições (ver imagem) e/ou representações heráldicas. Com estátuas jacentes, inclusive, onde se vê o próprio defunto a dormir.

Publicado no Jornal Beirão (64.ª edição)


[1] É a maior das três, com cerca de 146 m de altura; possui aproximadamente 2,3 milhões de blocos de pedra, colocados nas quatro faces da obra, as quais estão alinhadas com os pontos cardeais.
[2] Denominados por antas, dólmenes ou orcas.
[4] Medidas gerais do túmulo: 217 cm de comprimento x 115 cm de largura. Medidas da tampa: 177 cm de comprimento x 75 cm de largura. Altura máxima das letras: 14 cm. De registar que a tampa encontra-se fragmentada no canto inferior do lado esquerdo.
[4]Assassinado em 1837 (período pós Invasões Francesas), dentro da sua casa, em Paradinha, segundo se diz já adoentado, com um machado na cabeça, por José Teixeira.

 Autor: José Carlos Santos

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